Este é o título de uma obra da autoria de Catherine L’Ecuyer (com prefácio de Nuno Crato) que foi publicada em setembro de 2024, pela editora Plátano.
Trata-se de um texto onde se reflete sobre ação educativa nas escolas, a partir de um diálogo imaginado entre Cacilda, uma professora recém-reformada, e um estudante de Pedagogia, Matias, que necessita do seu apoio para concluir um trabalho. Ao longo das cerca de 300 páginas do livro, Cacilda confronta Matias com uma diversidade de questões sobre o ato de educar e aprender nas escolas, interpela as suas respostas e mostra-lhe outras possibilidades de se ser professor.
É através de uma obra de ficção que Catherine L’Ecuyer reflete acerca das escolas como espaços educativos e propõe, de um modo geral, uma via intermédia entre uma abordagem de pendor instrucionista e as propostas inspiradas no que a autora designa por construtivismo. Fá-lo em nome da necessidade do bom-senso, propondo, de um modo geral, que, nos momentos iniciais das aprendizagens dos alunos, se valorize a transmissão de conhecimento, para que, mais tarde, aqueles o possam mobilizar como instrumento de ação e de reflexão. Neste sentido, e independentemente da qualidade da obra, estamos perante uma perspetiva que se limita a renovar um apelo: o de modernizar o paradigma da instrução.
Apesar de ter apreciado o modo rigoroso, informado e original como aborda, por exemplo, o contributo de Rousseau no campo da educação ou a importância que atribui à reflexão epistemológica como componente da reflexão pedagógica, a obra não me aqueceu nem a alma nem o coração. É que estou cansado das perspetivas que tanto nos conduzem para o beco sem saída de um debate estéril entre a ideia de que os alunos são incapazes e a ideia, diametralmente oposta, de que são seres culturalmente autossuficientes, como para o pragmatismo inconsequente em função do qual se defende a necessidade de conciliarmos o melhor que, alegadamente, o instrucionismo e o dito construtivismo nos oferecem.
A sensatez, nesta como noutras ocasiões, só nos traz problemas, sobretudo porque contribui para os iludr e, deste modo, tornar aceitável algo que, em termos pedagógicos, corresponde mais um processo de modernização tecnocrática do que a um projeto de inovação cultural e democrática. A crença de que, em educação, se deve começar pela reprodução de conteúdos e pela prescrição dos modos de pensar e de agir, de forma a criarem-se as condições para que, no futuro, os alunos possam pensar de forma autónoma, crítica e criativa, é, na verdade, uma mistificação. Assenta num equívoco dramático, o de considerar que o significado daquilo que se aprende é uma questão que pode ser ignorada ou subestimada como fator potenciador das aprendizagens e do desenvolvimento da inteligência, bem como da humanidade dos alunos.
Por isso, é que o livro de L’Ecuyer, apesar de nos propor denúncias informadas, não deixa de me causar algum desconforto. O desconforto de alguém que sabe que não é necessário aprender primeiro para fazer depois. O desconforto de alguém que sabe, também, que a relação entre a apropriação do conhecimento culturalmente validado e o seu impacto ao nível do desenvolvimento das competências cognitivas, metacognitivas e socioemocionais dos alunos é uma relação que se retroalimenta. É que estamos perante ocorrências que podem ser vistas como concomitantes. Nem se definem em função de uma relação de precedência, nem se definem pela sua simultaneidade, dado que se intercondicionam para que possam acontecer.
Fontes
L’ Écuyer, Catherine (2024). Conversas com a minha professora: Dúvidas e certezas sobre a educação. Lisboa: Planeta.
"Faz agora. Um dia entenderá". Nem se entende um dia, nem se aprende. Como poderia a aprendizagem estar desvinculada de um entendimento?